Conversa de Cabeceira

Adriel Alves
4 min readNov 11, 2021

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— Não é curioso? Todos nós só estamos aqui por causa do sexo. A gente nasce porque algum dia alguém ocasionalmente flertou, iniciou uma relação e transou, e, querendo ou não, aqui estamos nós, fazendo sexo. Nascemos do sexo, vivemos pelo sexo, mas todo mundo evita falar sobre sexo.
— É tudo culpa da indústria.
Ele esboçou um sorriso de canto de boca.
— Indústria? Como assim?
— É! Não estou brincando! - Ela falou enquanto sorria.- A indústria está aí por trás de tudo, eles lucram com o tabu do sexo criando fantasias. É só ver os filmes de Hollywood com aquelas cenas cheias de gemidos, tudo muito exagerado e lotado de clichês que a gente nunca vê na vida real. E os filmes pornô? A maior ficção que já criaram! Gritos, frases sacanas, milhões de posições e infinitos tipos de sexo… Tudo isso pelo lucro, o sexo atrai dinheiro, justamente porque as pessoas gostam de mantê-lo na mais absoluta intimidade, entre quatro paredes cada um esconde seus escusos desejos sexuais. O sexo de verdade não vende, apesar de ser uma das coisas mais transcendentais e belas que experimentamos na vida.
— O que foi que você fumou, hein?
— Idiota.
Por um instante, ficaram mirando o vazio em silêncio.
— Se fosse Hollywood, a essa hora eu estaria aqui fumando um cigarro com uma pose de fodão.
Ela gargalhou.
— Pensando agora, eu vejo como isso é tosco, sabe - continuou ele.
— Pois é, o problema é que as pessoas estão tão acostumadas com as ficções na TV e nos livros que nem se dão conta de como são absurdas, e pior, desejam que aquilo aconteça na vida delas também. Nossa, isso destrói as pessoas, sabia?
— Nunca tinha visto isso dessa maneira…
Silêncio novamente.
— Lembrei aqui do dia em que eu estava sozinho em casa e coloquei um filme pornô na TV, aí comecei a me masturbar e estava tão distraído que nem percebi quando minha mãe entrou em casa. Ela deu um grito alto e eu quase infartei, e para piorar eu não sabia onde tinha deixado o controle remoto. Na hora, pareceu durar uma eternidade o momento em que eu girava feito barata tonta subindo as calças, atrás do controle, enquanto minha mãe tampava os olhos com as duas mãos.
Os dois riram até a barriga doer.
— Mas, falando sério, - continuou ele - já está mais do que na hora da masturbação deixar de ser tabu. Depois daquele dia minha mãe nunca mais tocou no assunto e a gente passou vários dias sem se olhar nos olhos. Eu era só um adolescente no auge da puberdade, sonhando em perder minha virgindade com alguma daquelas mulheres peitudas. Imagine só como teria sido bem melhor para minha saúde mental se minha mãe tivesse levado aquilo na boa, como uma situação engraçada, e sentado comigo e falado sobre tudo aquilo, que era normal e até saudável. Nossa, eu certamente teria amadurecido bem mais cedo.
— E desde quando você é maduro?
Ele sorriu rapidamente, aquele tipo de riso que expressa uma pontada miúda de raiva e, ao mesmo tempo, uma genuína alegria.
— Estou brincando - disse ela. - Pois é, ainda temos muito o que aprender, ou desaprender, né? É só ver a antiguidade, os gregos entendiam muito mais de sexo e eram bem mais liberais do que a gente, tinham aqueles bacanais e tudo… Mas também na época deles não tinha internet.
— Maldita internet, ou bendita, né? É como uma droga, uma injeção de prazer, não dá para viver sem. Agora estamos em um caminho sem volta. A tendência é que toda essa proximidade acabe afastando a gente uns dos outros. Quem diria que um dia a gente iria poder conhecer bem alguém sem nem mesmo ter visto a pessoa nos olhos…
— Nem estaríamos aqui agora tendo essa conversa maluca se você não tivesse comentado naquela minha foto.
— As coisas loucas da vida… Tudo é por um acaso, um pequeno desvio no caminho e, quando vemos, virou um novo horizonte.
Eles se entreolharam e fitaram os olhos um do outro em silêncio por um bom tempo.

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Adriel Alves

Poeta e cronista. Integrante do portal Fazia Poesia e da Impérios Sagrados. IG: @purapoesiaa. Inscreva-se no link: https://adriel-alves.medium.com/subscribe